Matilde
No dia seguinte àquele acontecimento que me tinha deixado a cabeça à roda fui para a escola meia hora antes na expectativa de encontra-lo e puder falar com ele. Ao contrário do que eu previa ele só chegou cinco minutos antes do toque. Inteligente, pensei.
-Daniel... Daniel! Olá...! - chamei-o mais que uma vez e sabia que a distância de cinco metros era mais que suficiente para ele me ouvir. Já calculava que ele fosse reagir assim, mas não tanto. Dirigi-me até ele e toquei-lhe com a mão no ombro; quando ele se voltou não parecia nada ele: cheio de olheiras, cara de sono e zangada.
-O que é que tu queres de mim agora?
-Sabes muito bem o que quero... Sabes que preciso de falar contigo - Olhei à nossa volta para verificar que não estava quase ninguém à nossa volta - Aquilo de ontem foi um acidente; eu e ele não somos namorados... foi por isso que não te contei, juro! Nós só nos encontramos para curtes, fumar, entre outras coisas que tu não ias gostar de saber.
-Conta-me - disse, com o mesmo ar de impaciente.
-Bem... na verdade, nós já tentámos assaltar um minimercado... correu mal e ainda temos de elaborar melhor os planos para tentar outra vez...
-É isso que me queres dizer? Adeus. - Deu meia volta e entrou na sala onde o professor já esperava por nós.
Naquele momento senti-me perdida, ainda não tinha melhor amiga, o Daniel estava zangado comigo. Já não sabia que fazer. Baldei-me às aulas toda
s desse dia, não estava com paciência para aturar os stores e já não tinha ninguém com quem conversar durante as aulas. Fui dar uma volta, arranjei charros e fui fumar para um pequeno campo que lá havia perto. Andei, andei no meio daquelas majestosas margaridas que lá se encontravam, bem altas, lindíssimas. Senti-me mal por estar a fumar perto delas. Apaguei o cigarro e sentei-me num pequeno monte de feno que lá havia. Pus os meus fones, coloquei a música no mínimo, para relaxar, e fiquei ali a pensar na vida o resto da tarde.
***
Feitas as malas senti-me triste comigo própria por não poder ter dito adeus ao Daniel, à Mafalda, ao Boss, à Cata, ao Di e a todos os meus amigos, antes de me mudar para casa do meu pai.
-Bem, mãe, então t-chau.
-Não tens de estar chateada comigo filha... Não tenho culpa de não ter dinheiro para arranjar um advogado melhor!
-Pois... - Tive de esperar uns minutos para que o meu irmão se despedisse da minha mãe, mas assim que ficámos prontos, levámos as malas até ao carro do meu pai e seguimos viagem. Durante esta, o meu pai e a sua namoradazita reles falaram como se eu e o meu irmão não estivéssemos lá, mas sinceramente nem me importei com isso, só pensava nos meus amigos e na minha mãe que estavam longe.
A casa dele era enorme, quatro quartos, duas casas de banho,uma sala do tamanho da casa da mãe e uma cozinha toda equipada com electrodomésticos topo de gama.
Eu e o Duarte iamos a subir as escadas para pousarmos as nossas malas num dos quartos de hóspedes quando o nosso pai nos chama.
- Meninos! Vocês pensavam que iam dormir aí em cima? - riu-se maldosamente - A partir de hoje vocês vão domir sempre na sala! - disse enquanto olhava para a namorada - Foi uma ideia da Bárbara, não é meu amor?
- Foi sim! Acho que será óptimo para vocês se ambientarem à casa. - disse a miss cínica.
- COMO ÉS CAPAZ DE NOS DEIXAR A DORMIR NA SALA? - gritei enquanto descia as escadas a correr e deixava o meu irmão a olhar especado para o andar de baixo.
-É um bom sitio para se estar, Tila! - respondeu o meu pai como se achasse mesmo que era um ideia fabulosa.
-TU NEM TE ATREVAS A CHAMAR-ME TILA DEPOIS DO QUE ME FIZESTE A MIM E À MÃE! - voltei a gritar enquanto lhe apontava o dedo. - Lá por teres conseguido ganhar este caso no tribunal, não quer dizer que vás conseguir ganhar a nossa confiança!
-Oh, querida, isso é sono! Eu agora vou para o sofá com a Bárbara, a partir de hoje vossa madrasta, mas podes sempre dormir na carpete...! Até que é bastante fofa!
-Eu digo-te onde é que vou dormir, vou! Mete essa carpete num sítio que eu cá sei, ouviste? E a ti e a tua namoradazita também! - Senti um braço a apertar-me a perna com força e quando me virei reparei que era só o meu irmão a chorar. - Anda, Duarte, vamos para - disse-lhe calmamente - NOSSO QUARTO- gritei furiosamente.
Nessa noite não consegui dormir com o raio do barulho que eles faziam na sala, quando adormeci já era de manhã. Levantei-me com cuidado para não acordar o meu irmão que dormia ao meu lado quieto e sossegado e aproveitei para mandar uma sms aos meus amigos mais próximos. Quando liguei o telemóvel reparei que tinha uma mensagem da Mafalda, a minha ex-melhor amiga.
“Estás perdoada; se quiseres vem ter comigo ao Blur Shopping às quatro da tarde”
Estava feliz por finalmente podermos falar sem a ter com aquela cara de impaciente e zangada, mas por outro lado não sabia como lhe dizer que tinha mudado para outra cidade, que apesar de ser mesmo ao lado, não era propriamente fácil lá chegar. Decidi ligar-lhe para lhe conseguir explicar tudo melhor e ouvir a sua voz.
Quando estava para lhe ligar, alguém entra no quarto; viro-me para ver quem é e a minha cara transforma-se numa expressão completamente diferente.